O Antigo Testamento
está repleto de leis. Ao todo são 613 estatutos dados por Deus ao povo de Israel.
A Bíblia que usamos incluem esses estatutos nos quais é revelada a vontade do
Senhor à vida do seu povo. Diante disso, vejamos como devemos lidar com a
pregação da lei de Deus.
A LEI É APLICÁVEL À IGREJA DOS NOSSOS DIAS, OU
FICOU RESTRITA AO POVO DO ANTIGO TESTAMENTO?
Precisamos
nos lembrar de que as regras estipuladas no Antigo Testamento objetivavam
orientar o povo de Deus em três aspectos: civil, cerimonial e moral. Alguns
preceitos regeram as relações sociais do povo de Deus, outros o culto e seus
sacrifícios, e ainda outros, as escolhas do povo.
O pregador
deve ser capaz de fazer uma aplicação válida da lei de Deus aos seus
contemporâneos. Nesse exercício há o risco de se aplicar diretamente a lei como
se o contexto atual fosse o mesmo dos dias veterotestamentários, o que traria
vários problemas.
Além da
aplicação descontextualizada, o pregador corre o risco de se deter apenas na
norma, na letra da lei, o que seria outro perigo. De que forma então devemos
compreender a lei e aplica-la sem escorregar nesse erro?
Devemos
entender que o relacionamento do povo de Deus precede a obediência. Ou seja,
Deus elege seu povo e depois dá a lei para que seus eleitos vivam em santidade.
Essa compreensão é fundamental para não fazer dos mandamentos do Antigo
Testamento uma série de condições para o relacionamento de Deus com o seu povo.
A Bíblia
nos mostra a precedência do relacionamento com Deus em relação à obediência da
lei. Em Gênesis 1.27-28, pode-se perceber que Deus abençoa Adão e Eva antes de
lhes dá exigências – de reproduzir e governar. A Noé e seus filhos é dada a
bênção antes de lhes dar a ordem: “Abençoou Deus a Noé e a seus filhos e lhes
disse: Sede fecundos, multiplicai-vos e enchei a terra” (Gn. 9.1). O decálogo é
precedido pela declaração da eleição de Israel: “Eu sou o Senhor, teu Deus, que
te tirei da terra do Egito, da casa da servidão" (Êx. 20.2ss). Dessa forma
podemos afirmar que a condição para o relacionamento com Deus é a graça divina,
e não a obediência.
A nossa
pregação deve ser moldada por isso. Pois se pregamos que o crente deve obedecer
para ser salvos invertemos a ordem das coisas e tornamos a nossa mensagem
legalista. É a graça de Deus que conduz o seu povo na obediência dos seus
mandamentos. Logo, a lei é para ser observada pelos salvos e não para a
salvação.
COMO APLICAR A LEI NA PREGAÇÃO
O pregador
deve pregar a lei como preceitos a serem observados pelo povo de Deus a fim de
imitarem a Deus em seu procedimento, e não como condição de salvação. A lei
retrata o legislador e a igreja deve conhecer o seu Senhor por meio dela.
Conforme esclarece Kuruvilla (2017, p. 166): “A lei bíblica coerentemente
requer que o povo de Yahweh seja como ele, pois descrições do seu caráter são a
‘revelação do padrão de santidade para o povo de Deus”. Portanto, a obediência
à lei leva o povo de Deus a viver em santidade no mundo.
O alvo da
lei é fazer com que aqueles que foram chamados por Deus manifestem as suas
virtudes divinas no mundo. Como revela o texto de 1 Pe. 1.16: “... por que
escrito está: Sede santos, porque eu sou santo” (cf. Lc. 11.44-45;19.2). Atentando
para o que diz a lei o povo se torna conhecido pela santidade de Deus. Dessa
forma a pregação da lei alcança seu objetivo.
OBSERVAÇÕES ACERCA DA INTERPRETAÇÃO DA LEI
Estou
consciente das divergências quanto à interpretação e aplicação da lei
principalmente entre as escolas: Luteranas, Reformadas, Dispensacionalistas e a
Nova Perspectiva de Paulo (NPP). Sugiro a leitura do livro “O Texto Primeiro”,
de Abraham Kuruvilla para um maior aprofundamento acerca da interpretação da
lei. O autor defende que toda a lei
pode ser aplicável a igreja dos nossos dias. Sua proposta se baseia no
argumento de que todo texto bíblico, incluindo as leis veterotestamentárias,
revela o que é chamado de “mundo do texto” no qual é descrito a vontade eterna
de Deus para o seu povo.
Portanto, naquilo
que foi dito acima sobre a relação lei-eleição-obediência é preciso observar
essa relação para que a lei do Senhor por cumprir o seu objetivo na igreja de
Deus e esta testemunhe sua eleição no mundo através da obediência aos
princípios fundamentais revelados por Deus ao seu povo de todos os tempos.
REFERÊNCIA:
KURUVILLA,
Abraham. O Texto Primeiro. São
Paulo: Cultura Cristã, 2017.